Quase três meses depois, estou aqui. Acho que agora consigo colocar em palavras um pouco do que foi a experiência mais transcendental da minha vida.
Haja coração. E vai ter o maior textão da história. Só leia se realmente sentir ✨
01/04/2021.
19:00. Depois de uma caminhada de fim de tarde com a minha mãe, senti a barriga mais pesada do que o normal e a pele quase rasgando pra sustentar a Analua em meu ventre - este que já se preparava para deixar de ser lar.
Há dias que me sentia exausta por conta das 41 semanas e 3 dias de gestação. Família, amigos, vizinhos e todos os conhecidos (e também desconhecidos) me bombardeavam com as perguntas: “Quando ela vem? Essa menina não quer nascer não?”. Dentro de mim a certeza: Analua virá quando estiver pronta. Ela me disse exatamente essa frase em um sonho. E foi assim, naquela noite, que a nossa primeira grande aventura começava.
20:00. Tomei um banho quase o tempo todo de olhos fechados. Aquela noite não era pijama que eu queria vestir. Mas uma saia longa amarela. Ela ta chegando... me sinto tão diferente.. Algo acontece nas horas antes do parto que simplesmente não da pra explicar. A gente entra em transe.
As contrações começaram, ainda sem ritmo, mas com uma intensidade incrivelmente forte. Eu sempre ficava imaginando o que faria quando começasse a sentir as primeiras dores, mas o trabalho de parto é realmente louco. Tira a gente do chão. Além de imprevisível e completamente intuitivo.
Avisei minha mãe e o Re sobre o inicio das contrações, peguei o violão e comecei a tocar. Até hoje me pergunto como os dois ficaram tão calmos. Ou como conseguiram disfarcar o nervosismo tão bem.
O Re se juntou a mim e minha mãe cantava com a gente enquanto punha a mesa – muitas frutas, uma torta, café (caso ela, o Re e as parteiras precisassem durante o trabalho de parto) e muito amor. Tudo pronto.
Foram eles os escolhidos para participar deste momento. Desde o começo da gravidez, nos preparamos para que a chegada da Nalu acontecesse em casa, a luz de velas, na banheira, da maneira mais natural e gentil possível. Com o mínimo de gente possivel. E foi exatamente esse o nosso “time”: Re, minha mãe, Babi e Fran - nossas parteiras bruxas.
Entre uma música e outra sentia meu corpo todo estremecendo. A música me servia como um calmante e ao mesmo tempo como uma ponte para a travessia prestes a acontecer.
Mais duas músicas, outra contração. “ Eu acho que é hoje. Ela ta chegando. Pode cronometrar!” Lembro de ter falado pra ele, que há alguns dias já tinha baixado um aplicativo que de acordo com o interval entre as contrações mostra quando o trabalho de parto começaria. Pois bem. Começava ali.
A cada nova dor, eu fechava os olhos e visualizava o mar. Como se cada contração fosse uma onda gigante, daquelas que às vezes até fazem a gente perder o ar. Depois, vinha uma calmaria, como o balanço de um mar tranquilo que nos convida a boiar e ouvir o silêncio que mora na profundidade de suas águas. E assim, fui tirada para dançar nesse fluir de emoções que invadem nosso corpo durante o trabalho de parto. Onda. Calmaria. Onda. Calmaria. Só preciso aguentar mais uma contração. E mais uma. E mais outra. E cada uma delas me levam mais perto da Nalu.
As ondas se intensificam e ligo pra Babi, pedindo para que ela venha o mais rápido possível. Entro de novo no chuveiro, porquê só a água quente me fazia sentir melhor.
Três minutos. Este era o intervalo entre uma dor e outra.
Durante o parto, as dores vêm acompanhada de uma onda de hormônios que invadem o corpo sem pedir licença. São como raios que rasgam o céu em meio à tempestade, iluminando tudo. A cada nova dor, uma nova luz, trazendo força e clareza para que eu pudesse enxergar em meio à escuridão do desconhecido.
Escuro. Escuro. Mais escuro.
Me sinto entrando em outra dimensão. Já não vejo mais nada aqui fora, Não importa mais nada. Não há tempo, espaço. Só há um caminho. E a ele me entrego. Confiando que meu corpo sabe o que fazer. E no silêncio, de olhos fechados, eu sabia exatamente onde a Analua estava. E o que eu precisava fazer.
Vou pra cama. Quatro apoios é a única posição que consigo ficar. ESPAÇO. Ela precisa de espaço. Como uma leoa, uma loba, literalmente uivo de dor. Resgatando uma força selvagem que habita o meu íntimo. Minha mãe massageia a minha lombar, trazendo todo o cuidado e força não só dela, mas de todas as ancestrais e mulheres da nossa linhagem. Enquanto o Re enche a banheira, acende as velas, espalha óleo essencial de lavanda pela casa e conecta a playlist com as músicas que escolhemos para este momento. Ainda que fazendo tudo isso, ele não sai de perto de mim. Onipresente. Calmo. Perfeito. É assim que consigo descrever como foi ter a sua companhia e seu olhar me conduzindo durante todo o parto. O seu olhar.. eu nunca vou esquecer do seu olhar pra mim durante o portal de vinda da nossa menina.
“O que eu tenho que fazer? Que posição eu tenho que ficar?”. Em alguns momentos de insegurança tento me lembrar dos livros que li, dos vídeos que assisti, dos relatos que me prepararam para este momento. BRANCO. Ou melhor, PRETO. É assim que se encontra a minha mente neste momento. Não lembro de nada. O racional vai desligando, contração após contração. Calando toda e qualquer voz que exista aqui dentro. Agora só há uma voz a seguir: a voz da intuição. CONFIAAAA! Você sabe parir.
Mais uma contração. E me sinto inundada com um líquido quente que é litealmente jorrado para fora de mim escorrendo pelas minhas pernas. “A bolsa estorooooouuuu”, minha mae gritou. Que sensação deliciosa! Analua tá chegando.
Volto pro chuveiro. Continuo de olhos fechados. Porque a sabedoria ta dentro. Cada célula do meu corpo parece resgatar e se conectar com um conhecimento ancestral. A dor se intensifica. Mas a vontade de conhecer a minha filha também. O medo vem. Será que estou pronta ? Será que vou dar conta? E as contrações me puxam pro presente, desligando cada parte de mim que ainda duvidava do que meu corpo é capaz de fazer. E a cada novo minuto vou me sentindo mais pronta para deixar de ser morada da Nalu. A cada novo minuto vou sentindo mais vontade de sentir o cheiro dela. De olhar pra carinha dela.
Sigo de olhos fechados. Porque era bem assim que eu sabia e sentia onde a Nalu estava.
Partolândia que fala né? Oi, prazer querida..turubô?! Minha primeira vez aqui. 😂
Pois bem. A partir desse momento tenho flashs. e não sei se em ordem cronológica. Porquê né.. o tempo é uma ilusão.
Flash. Contração. Olhar do Re. Flash. Contração, Gritos. Flash. Contração. Medo escorrendo pelo ralo junto com a água quente do chuveiro e com meu choro. Contração, respiro, e me dou conta: CADE A PARTEIRA?. Flash. Contração, olho para o lado: Babi chegou! E tá ali, como uma leoa, me olhando de perto. Tão perto que na próxima contração dou um soco na parede, que quase acerta a sua cara ( meu Deus! Ser parteira é realmente do caralh**! Quanta admiração por você, por vocês todas! Parteiras , doulas, etc.). Flash. Contração. Estou na banheira. Não lembro como, mas que delicia. Ouço minha mãe andando pela casa rezando o terço. FÉ! A fé move, transborda, conduz. Fé. Foi o que fez a sala de casa parecer um estádio de tanta presença e seres de luz que estavam ali com a gente. Flash , Ouço a música tocando. Lembro de cerimônias de Ayahuasca que me prepararam para este momento. Lembro de pessoas que amo e que foram fundamentais para a minha jornada até aqui. Canto, choro, grito. Canto gritando, Grito cantando. Muita dor. Muitaaaa. Não sei se aguento. Olho pra Babi: NÃO VOU AGUENTAR! . E ela, com sua experiência, já sabe que vou, porque é exatamente isso que a maioria das mulheres fala quando está ha minutos da travessia.
Tá chegando a hora!
Vamos filha, sou eu e você! Me guia. Eu te prometo que vai valer muito a pena nascer!!
VEM ANALUA! Gritava o papai, a mamãe e a vovó.
“Quanto tempo você acha que vai durar o seu parto?” lembro que a Babi me perguntou em uma das consultas no pré natal. “Eu vejo algo rápido, Babi. Sinto que vai ser rápido. Tipo umas 6horas.”. E a partir dali, esse era o tempo que eu sempre visualizava em minhas meditações quando pensava em quanto tempo o parto duraria.
2:56. Seis horas depois da primeira contração. Analua nasceu! Foram precisos dois puxos. Um para sair a cabeça e o outro para passarem os ombros. Gritei tanto, mas tanto, que até hoje não sei como os vizinhos não chamaram a polícia. Um grito ensurdecedor. Deixo que ele flua livremente – quanto mais vocalizamos e abrimos a boca, mais relaxamos a vulva e toda a região do períneo. A dor? Muito se fala sobre a dor do parto… “a maior dor do mundo”. Dói? Realmente dói. Muito. Arde. Queima. Lateja. Estremece. Mas nada se compara ao amor de segurar a sua cria pela primeira vez – e pro resto da vida – no colo. Isso sim é a maior sensação do mundo.
O mundo parou a hora que segurei ela nos braços e ela me olhou profundamente nos olhos. Dei um cheiro na sua testa e senti o cheirinho que sinto todos os dias: cheiro de Nalu 🌈✨
Saímos da banheira e Deitamos no sofá. Estamos em casa. Seguros. Nalu nasceuuuuu! NÃO ACREDITO! É Real.
Ela mama logo nos primeiros minutos. Esperamos o cordão parar de pulsar para queimá-lo com uma vela. Papai faz o ritual.
É tanto amor e ocitocina que acho que não vou dormir nunca.
Bem vinda, Nalu! E bem vinda Letícia. Afinal. Morro e renasço ali. dentro daquela banheira, no momento que pego a minha filha no colo, olho para os seus olhos e penso: NÓS SOMOS FODAS. E é só o começo.
Eternamente grata à Nalu por ter me escolhido como sua guardiã aqui na Terra. E eternamente grata a vocês, que estiveram ao meu lado nesse portal.
Ao amor da minha vida e manifestador deste e de tantos outros sonhos em conjunto. Obrigada pelo melhor presente da minha vida. Eu amo muito a nossa família!
Obrigada à minha mãe por ter me dado a vida e agora poder estar ao meu lado durante todo o parto. Obrigada por ter sido tão corajosa, amorosa, tranquila e parceira em aceitar o convite mais doido que eu já te fiz na vida! Você é meu maior exemplo de força, amor e superação.
Obrigada à Babi por ser bruxa, parteira, curandeira entre tantas outras mulheres incríveis dentro de uma só. Ter o seu acompanhamento, sabedoria e confiança durante toda a jornada foi fundamental. Honro sua ancestralidade e missão de alma! Obrigada a Fran por trazer tanta sutileza, carinho e cuidado no momento mais forte e ao mesmo tempo vulnerável de toda a minha vida. É lindo demais saber que vocês estão presentes em tantos nascimentos trazendo tanto amor para toda a família! Gratidão 🤍
Obrigada a todas as pessoas que estavam conectadas com a nossa família em oração, vibração, intenção. Austrália, Europa, Canadá e vários lugares pelo Brasil: deu pra sentir todo o amor e força de vocês.
E gratidão a mim mesma por acreditar no meu corpo, no meu poder e na minha força. NÓS SABEMOS PARIR!!!!!
Inesquecível 🙏🤍💫✨
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